Bioética

CARTA DE SÃO PAULO, 2005

Eutanásia
Considerando que:

1) A vida nos é concedida por Deus e somente por ELE pode nos ser tirada;
2) Todos têm direito à preservação da vida;
3) A encarnação é necessária para a evolução do espírito e deve ser preservada até o fim natural;

Resolve que:
1) Somos contrários à qualquer método de eutanásia que objetive abreviar a vida, antecipando a desencarnação;
2) Somos contrários à distanásia como meio de prolongar a vida do paciente utilizando-se de processos terapêuticos cujos efeitos são mais nocivos do que os efeitos do mal a curar ou inúteis porque a cura é impossível e o benefício esperado é menor que os inconvenientes previsíveis;
3) Somos favoráveis à morte natural, compreendendo-se como sendo um método de permitir a desencarnação no tempo certo, com alívio das dores e não incorrendo em prolongamento abusivo com aplicação de meios inapropriados que imporiam sofrimentos adicionais;
4) Somos contrários a qualquer método de suicídio assistido, que se compreende como um ato voluntário do médico, abreviando a vida do paciente, a pedido deste. Nosso compromisso é com a vida!

Direitos do embrião

Considerando que:
1) A vida é um bem outorgado por Deus, a qual todos têm direito;
2) O espírito inicia a nova encarnação na fecundação e passa a comandar a embriogênese, em todas as fases, até o término da gestação;
3) De acordo com O Livro dos Espíritos, existem embriões que possuem ou não espíritos destinados à reencarnação;
4) Não existe consenso científico relativo à clonagem humana e terapêutica e também nas manipulações genéticas;

Resolve que:
1) Os direitos do embrião começam com a fecundação;
2) Somos contrários a qualquer método de anticoncepção que interrompa a embriogênese a partir da fecundação;
3) Somos contrários à qualquer intervenção, terapêutica ou não, que interrompa a gestação em qualquer fase, exceto quando houver risco de morte para a mãe;
4) Nos casos de gravidez com más formações congênitas (anencefalia, hidrocefalia, cardiopatias, meningomielocele e outras) recomenda-se orientação aos pais e envolvidos para que conduzam a gestação até o seu termo;
5) Somos favoráveis aos métodos de controle de natalidade que impeçam a fecundação, como, por exemplo, anticoncepcionais orais e barreiras (preservativos e diafragma), método Ogino-Knauss;
6) Como ainda não existem meios para identificar quais os embriões congelados que possuem ligações com espíritos reencarnantes, todos devem ser preservados;
7) Somos contrários, no momento atual, à clonagem humana, tanto reprodutiva quanto terapêutica, tendo em vista que não podemos realizar experiências em anima nobili (seres humanos vivos);
8) E preciso Implantar um trabalho preventivo de orientação sexual pelas AMEs, junto aos pais e educadores, bem como às crianças e adolescentes.

Em relação ao aborto

Considerando que:
1) nosso paradigma de bioética é o personalista espírita que contempla a dignidade ontológica, a partir do zigoto, onde a vida se inicia;
2) a vida é um bem indisponível, uma doação do Ser Supremo, que se encontra presente no micro e no macrocosmo, conclusão esta decorrente de pesquisas científicas sobre a origem da vida que apontam para a existência de um Planejador Inteligente, bem como de estudos sobre a embriogênese e o psiquismo fetal. As dificuldades dos cientistas em definir o que é vida e a impossibilidade de criá-la originariamente em laboratório são alguns entre os muitos dados demonstrativos da grandeza e da complexidade da Criação Divina.

Posicionamo-nos contrariamente a qualquer método que interrompa a vida em algum ponto do continuum “zigoto-velho", inclusive ao uso da "pílula do dia seguinte" e favoravelmente ao Planejamento Familiar, através de métodos não-abortivos, incluindo, entre estes, o DIU (Dispositivo intra-uterino), desde que utilizado, no período fértil, em combinação com método de barreira.

Em relação aos fetos anencéfalos

Considerando que:
1) o anencéfalo tem preservadas diferentes partes do encéfalo, tais como tronco encefálico, região talâmica e até mesmo porções do córtex cerebral, possuindo, portanto, regiões responsáveis pelo controle automático de funções viscerais como os batimentos cardíacos e a capacidade de respirar por si próprio, ao nascer;
2) para distintos cientistas, o tronco encefálico e porções adjacentes de regiões mais profundas do cérebro representam o substrato de ligação com a mente e a consciência (postura que sinaliza a presença do Espírito).

Manifestamo-nos contrariamente ao aborto do anencéfalo, pois não podemos reduzi-lo a uma "coisa descartável", reconhecendo seu direito à própria vida, ainda que temporária.

Em relação às células–tronco embrionárias

Considerando que:
1) as pesquisas com células-tronco embrionárias, embora, teoricamente, mais promissoras, têm revelado, na prática, alto risco na geração de tumores, sendo passíveis de provocar rejeição;
2) essas pesquisas são realizadas sem o devido respeito ao embrião, reduzido simplesmente à condição de "coisa";
3) Uma vida (a do embrião) não pode ser interrompida em benefício de outra;
4) as pesquisas mais recentes têm demonstrado maior praticidade e boa potencialidade no emprego das células-tronco adultas, com menor risco de rejeição ou de provocar tumores e com bons resultados em casos de leucemias, cardiopatias, AVC (Acidente Vascular Cerebral) etc.

Declaramo-nos contrários à utilização das células-tronco embrionárias, quer seja em pesquisas ou em terapias, mas posicionamo-nos favoravelmente à utilização das células-tronco presentes no indivíduo adulto e no cordão umbilical.

Em relação à eutanásia, à distanásia e à morte natural

Manifestamo-nos:
1) contrariamente a qualquer meio intencional que antecipe a morte natural do ser humano, seja pela eutanásia, ativa ou passiva, ou pelo suicídio assistido.
2) contrariamente à distanásia, por entendermos tratar-se de um prolongamento inútil da vida, por uma obstinação terapêutica ou diagnóstica, através de meios artificiais que não trazem benefícios imediatos ao paciente, levando-o a uma morte agoniada, com muito sofrimento orgânico, psíquico e espiritual.
3) favoravelmente à ocorrência da morte natural, a que se dá no tempo certo. Compete-nos respeitar a autonomia do paciente - suas crenças, medos, desejos e esperanças -, oferecendo-lhe apoio médico, psicológico, religioso e familiar, que lhe possibilite morrer sem dor e viver, com dignidade, seus últimos instantes de vida terrena. Compreendemos o processo do morrer como uma fase importante para o aperfeiçoamento do Espírito, repleto de experiências enriquecedoras, tanto para o médico, quanto para o paciente, sobretudo, quando ambos têm os olhos voltados para a realidade da vida imortal.
São Paulo, 28 de maio de 2005


CARTA DE SÃO PAULO, 2007
Adendo à Carta de Princípios Bioéticos da AME-Brasil

Nós, médicos espíritas, reunidos no VI Medinesp, na cidade de São Paulo, em 08/06/2007, elaboramos a seguinte Carta de Princípios, a partir da temática estudada:

A atualidade do contexto social brasileiro envolve temas afetos à área médica que, pela gravidade perante o direito primordial à vida, exigem posicionamentos claros e atitudes firmes. Alguns desses tópicos têm levantado dúvidas e interpretações equivocadas sobre nossa última carta de princípios (2005).

Algumas perguntas são freqüentes ao Movimento Médico-Espírita, às quais buscamos esclarecer a seguir.

1) O que é morte natural?
É a que sobrevêm pelo esgotamento natural dos órgãos, em conseqüência da idade ou pelo esgotamento do fluido vital em decorrência dos hábitos de vida ou de uma patologia.

2) O que é ortotanásia?
O termo ortotanásia, em linguagem médica, significa morte no tempo correto, e é um procedimento que visa à humanização da morte, sem a utilização de meios para abreviá-la e também sem tomar atitudes desproporcionais para mantê-la. O termo para a Medicina tem sentido diferente do usado na área jurídica, que o utiliza como sinônimo de eutanásia passiva, gerando tais equívocos.

3) Qual o posicionamento do Movimento Médico-Espírita diante da resolução do Conselho Federal de Medicina sobre a ortotanásia?
A Resolução do Conselho Federal de Medicina de nº 1805, publicada no Diário Oficial da União em 26/11/2006, está de acordo com o entendimento da AME-Brasil quanto à definição do termo, preocupando-nos apenas com a aplicabilidade e a fiscalização dos procedimentos diante da mesma.

4) Como proceder diante da posição do Governo Federal sobre a descriminalização do aborto, embasado na afirmação de que seria um problema de saúde pública?
Somos totalmente contrários a essa posição, porque o direito à vida é inviolável e divino. Legalizar o aborto não é só descriminalizar o agente de um ato tão hediondo. É agir contra o direito à vida de um inocente, incapaz de lutar por si mesmo.
A solução para o problema de saúde pública devido às conseqüências dos abortos clandestinos não é legalizar ou descriminalizar o aborto, favorecendo este ato criminoso. O caminho é oferecer educação adequada e contínua a toda a população, objetivando medidas eficientes de planejamento familiar, sem assumir ações de banalização para atividade sexual e para o relacionamento afetivo.

5) O que é anencefalia e qual a visão da legalização do aborto de anencéfalos?
A anencefalia não é uma condição de completa ausência do sistema nervoso central e os defeitos anatômicos presentes são de diferentes graus. Sempre há a preservação do diencéfalo – sede da ação do espírito no corpo físico e base neurológica para a vida orgânica. O anencéfalo, independentemente da possível expectativa de sobrevivência, não deve ter violado o seu direito de viver e cumprir os propósitos para a sua existência e encarnação.

6) Como o Movimento Médico-Espírita se posiciona diante das técnicas de reprodução assistida?
Somos favoráveis às técnicas, mas com a preocupação da necessidade do aprimoramento das mesmas, de modo a evitar a produção de embriões excedentes.

7) Qual deve ser a postura diante dos embriões excedentes não transferidos na fertilização in vitro?
As decisões neste sentido cabem aos casais.

Considerando, portanto, todas as colocações acima, reafirmamos que o Movimento Médico-Espírita é:
a) Contra a eutanásia e a distanásia, referendando a escolha de atitudes terapêuticas que permitam a morte natural com menor sofrimento e total apoio para o paciente e a família.
b) Contra quaisquer formas de violação do direito à vida, que se inicia, do ponto de vista físico, com a fecundação e cessa na desencarnação.
c) A favor de políticas de saúde que promovam a educação da população, visando os princípios ético-cristãos.
d) A favor de quaisquer ações terapêuticas que, no caso de infertilidade, possibilitem ao casal a oportunidade de promover e valorizar a família.

São Paulo, 8 de junho de 2007.